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Direito à liberdade de expressão nas redes sociais

10 Junho 2020

Liberdade de expressão é um direito fundamental, presente na Declaração de Direitos Humanos, e assegurado na Constituição Federal. O artigo 5º o consagra, definindo suas facetas em diversos incisos, sendo a principal, a prevista no inciso IV:IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato.

Trata-se de tema complexo, multifacetado, pois a expressão de uma pessoa pode se desdobrar em diversas manifestações de pensamento, de convicções, crenças morais, éticas, religiosas, científicas, artísticas, políticas, ideológicas, até o limite da capacidade intelectiva da espécie humana.

Nos últimos anos, a capacidade de expressão foi severamente aumentada pela disseminação das mídias sociais, onde cada pessoa pode expressar a sua opinião sobre qualquer assunto para que, virtualmente, todos tenham acesso. Isso jamais ocorreu na história da humanidade.

O que deveria ser visto como algo positivo para o desenvolvimento da sociedade, contudo, não chegou sem causar problemas: muitos, ao se depararem com uma opinião que não concordam, pensam “como assim essa pessoa pode dizer uma coisa dessas?!"

Não é raro ouvirmos de alguém que “deixou de suportar" outra pessoa justamente por conta de, agora, pelas redes sociais, saber o que ela pensa.

Juridicamente, a questão tem vários desdobramentos. Em regra, deve ser livre a expressão enquanto discurso e enquanto não representar qualquer ameaça ou dano à outrem.

A interpretação do que é mero discurso, opinião, crítica, e do que causa ou não dano a outrem é complexa, e desperta paixões. Geralmente, estamos mais propensos a permitir que os discursos com os quais concordamos são inofensivos, ou até mesmo meritórios, enquanto tendemos a achar criminosas as opiniões contrárias às nossas crenças ou à nossa imagem.

Em virtude das implicações políticas recentes, a questão vai ser amplamente debatida pela sociedade brasileira. É uma pena que a discussão se dará em ambiente de conflito, mas essa parece ser a natureza humana.

O debate ultrapassa as fronteiras nacionais: o presidente dos EUA, Donald Trump, teve um Tweet deletado pelo Twitter, após um check facts ter considerado a mensagem como falsa. O político não gostou nem um pouco de ter sua fala apagada e afirmou que era uma violação inaceitável ao freddom of speach, com finalidade de limitar seu discurso político por razões ideológicas.

Nos Estados Unidos a liberdade de expressão conta com amplo respaldo do Poder Judiciário sendo assegurada a maior liberdade possível de manifestação de pensamento, raramente encontrando algum limite e consequência penal. Para se ter uma ideia, não é ilegal que alguém vá a uma praça pública e defenda a escravidão de negros naquele país. O mero discurso não é crime nos EUA.

No Brasil, ao contrário dos EUA, a tradição é de restringir a liberdade de manifestação, de discurso. Nos EUA as palavras não podem ser proibidas. No Brasil é crime a mera manifestação (simplesmente falar ou escrever) em defesa do nazismo, por exemplo.

Nossa cultura jurídica é de não aceitar discursos que atentem contra a igualdade, que semeiem o preconceito, enfim, que atente contra a dignidade da pessoa humana. Em tempo, sou completamente contrário ao nazismo, não quero a liberação de tal discurso, nem da apologia a escravidão, de qualquer povo, pessoa, etnia, origem, etc. (é preciso dizer isso expressamente nesse mundo de opiniões em massa).

Voltando ao tema, a julgar pelos últimos fatos, a tendência brasileira é a de restringir cada vez mais a liberdade de expressão. Cada vez mais toma força o discurso de não se poder permitir o discurso de ódio.

Em defesa desse rigor, surgem propostas de controle da mídia, das redes sociais, da verificação do que são fake news, inclusive com a instauração de um inquérito pelo STF, no próprio STF, para defender o mesmo STF contra fatos que, à rigor, não são elencados pela legislação como crime: não existe o crime de fake news.

Além do STF, o Parlamento instaurou uma CPI para apurar as fake news. As justificativas variam de “defesa das instituições" até “grupos criminosos que fazem ataques difamatórios organizados". Também se afirma que as eleições foram vencidas por mensagens falsas em grupos de WhatsApp. Todas essas medidas tem o objetivo final de limitar, em certa medida, a liberdade de expressão.

Difamação, sim, é um crime previsto em lei, ao lado de calúnia e injúria. A legislação já prevê uma punição para esses casos e, a julgar pelas penas aplicadas, não são considerados crimes graves. Isso pode mudar daqui para frente.

Cabe uma reflexão: no cerne da liberdade de expressão reside a liberdade de criticar o governo e as instituições do estado. Proibir a crítica às instituições não tem nenhum amparo na liberdade, na responsabilidade, na democracia e na república. Aliás, é da essência do Estado Democrático de Direito que se possa fazer críticas às instituições, sejam elas fundadas ou não.

Autor: Octávio de Moraes Firpo.

Casser & Firpo Advogados